Se há alguma mudança em Goiás, não é no Executivo, conforme prometeu e não cumpriu Caiado, mas, sim, na Assembleia, que pela primeira vez na história é um Poder próximo da independência
Uma das maiores surpresas negativas do governo Ronaldo Caiado – e são várias – foi a falta de habilidade para construir uma base de sustentação segura e estável na Assembleia Legislativa, imprescindível para que a administração consiga aprovar seus projetos e achar um norte para os seus próximos anos de mandato. Por dois motivos: 1) imaginava-se que esse desafio seria superado pela suposta experiência de Caiado na área parlamentar, setor onde passou os mais de 20 anos da sua vida política e 2) nem é tanto um desafio, diante da facilidade para acertar o apoio dos deputados, coisa que todos os governadores, nos últimos 60 anos pelo menos, conseguiram com pouco esforço – é inegável que sempre há, em todas as Legislaturas, uma tendência irrefreável para se ajoelhar ao Executivo, fisiologicamente no mais das vezes, porém quase sempre em troca de quase nada.
O fato é que Caiado foi e tem sido um fiasco no seu relacionamento com a Assembleia. O nome que queria para presidir o Poder foi vexatoriamente derrotado e ele acabou obrigado a engolir Lissauer Vieira, que foi escolhido pelos seus pares quase que unanimemente como expressão de um desejo de autonomia do Legislativo em relação à Praça Cívica. A inovação começou aí e daí em diante ocorreu uma sucessão de tropeços para o governo, vivendo-se hoje uma situação em que só é garantida a aprovação para matérias rotineiras e sem importância. Se houver alguma polêmica, como na mudança das regras do Passe Livre Estudantil, nada feito. Aliás, nesse caso só não houve uma massacrante rejeição do plenário porque Caiado recuou a tempo e retirou a proposta.
Como nunca se viu antes, deputados falam abertamente em derrubar vetos, em rejeitar as possíveis medidas do Executivo, como a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal, que venham a ser submetidas à Assembleia e elevam o tom ameaçando impor punições ao governador caso não cumpra a obrigação de fazer os repasses do duodécimo ou de pagar as emendas orçamentárias. dos parlamentares. Tudo isso é inédito na história política de Goiás. Jamais, em tempo algum, a autoridade do Palácio das Esmeraldas perante o Legislativo foi tão menosprezada. Se há alguma mudança ocorrendo no Estado, é o posicionamento independente da Assembleia e o seu crescimento como Poder, para azar de Caiado.
Para completar esse quadro completamente novo que se instalou na política estadual, os deputados estão até dando lições de comportamento republicano a um governador que se gaba de seguir esse princípio, porém não age bem assim. É que, no caso das emendas orçamentárias dos deputados, Caiado insiste na tese de pagar, mesmo parcialmente, apenas as de iniciativa dos membros da sua bancada, recusando as da oposição – repetindo, aliás, a mesma discriminação que os governos do passado faziam. Só que… não, disseram os deputados, unanimemente. As emendas não são direito, em razão do orçamento impositivo, de uns ou de outros. São de todos os 41 integrantes do Poder. Envolvem recursos que, ao serem pulverizados em obras e programas pelo interior, vão beneficiar o conjunto da população. Respeitá-las, no conjunto, atendendo a todos os parlamentares e não apenas aos que votam a favor do governo, é um ato de lealdade a que Caiado quer se recusar, mas deve à sociedade. Olhem só, leitora e leitor, que baita novidade: a Assembleia, logo a Assembleia, está ensinando ao governador que os recursos públicos devem ser geridos sem filtros políticos ou partidários.