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José Luiz Bittencourt sobre política, cultura e economia

25 jan

Legado de Maguito, fabricado após a sua morte, acabará sendo útil para Goiás ao indicar para o MDB e até para a classe política em geral que o caminho da conciliação é o mais adequado

Inventaram que Maguito Vilela foi uma espécie de apóstolo da conciliação e da pacificação na política.  Não é verdade, mas, mesmo assim, tudo indica que essa criação terá um papel no futuro de Goiás, de cara ao induzir o seu filho e presidente estadual do MDB Daniel Vilela a um comportamento moderado e amigável, coisa que nunca fez parte do seu perfil. Daniel é impulsivo, vingativo e truculento. Ou era. Basta conferir a virulência com que reagiu ao que chamou de “traição” à sua candidatura intempestiva a governador em 2018, quando uma ala pragmática do partido, cansada de 20 anos de derrotas consecutivas, resolveu apoiar o projeto vitorioso do governador Ronaldo Caiado.

Com apoio do pai, Daniel perseguiu prefeitos da estatura de Adib Elias, em Catalão, ou Paulo do Vale, em Rio Verde, expulsando-os do MDB como se estivesse punindo moleques travessos. Com Renato de Castro, em Goianésia, foi muito pior, ao cassar ditatorialmente a sua reeleição – no que teve, também, o respaldo de Maguito. O conciliador e o pacificador, naquele momento, ficou ao lado do filho, ambos duros e insensíveis como uma rocha. Foi uma caça às bruxas como se nunca viu na política estadual, levando, no final das contas, a um encolhimento do MDB – já que todos os proscritos pela dupla de Vilelas terminaram como grandes vencedores da última eleição municipal.

Em 1994, quando se elegeu governador, Maguito teve um enfrentamento pesado com Caiado. A campanha foi agressiva, com os dois quase chegando aos tapas nos intensos debates que travaram. Um deles nunca esqueceu e nunca perdoou. Pelos mais de 25 anos transcorridos desde então, não mais se encontraram, trocaram palavras ou sequer se cumprimentaram. Uma pesquisa aprofundada no Google Imagens mostra no máximo um par de fotos o exibindo juntos, durante a campanha de Iris Rezende ao governo do Estado em 2014, quando Caiado integrou a chapa do MDB como candidato a senador.

No ano passado, atendendo a uma orientação de Iris, Maguito foi ao Palácio das Esmeraldas para uma audiência reservada com Caiado. Seu objetivo era aparar arestas para abrir caminho para a sua eventual candidatura a prefeito de Goiânia, na época uma incógnita: Iris ainda não havia se decidido pela aposentadoria. Apesar do tom cordial e civilizado, a reunião deu em nada, mas provavelmente deve ter sido a única conversa que Maguito teve com Caiado desde os embates de 1994. Nem o governador nem o emedebista falaram ou deram qualquer esclarecimento sobre o que um disse ao outro e o outro disse ao um, no “evento”.

Em 1998, a candidatura de Iris a governador navegava em mais de 70% das intenções de voto, com a oposição desorientada, sem candidato competitivo para lançar. De Brasília, onde já se prenunciava a vitória de Fernando Henrique Cardoso, veio a inspiração para um acordo entre o MDB (PMDB, então) e o PSDB. Iris, esse sim um conciliador e um pacificador, até onde isso pode existir na política, quis. Maguito, candidato ao Senado, também embalado pelas pesquisas, vetou. Na calçada do prédio de apartamentos onde morava Otoniel Machado, primeiro irmão e coordenador da campanha, ele esfregou o pé direito no chão e determinou: “Vamos esmagar a oposição como se fossem baratas”. Depois, cedeu, para humilhar os adversários com a oferta da 2ª suplência de senador para Marconi Perillo, em vez da pretendida vice-governadoria, maior erro histórico que o MDB cometeu em toda a sua trajetória em Goiás e que culminou com a derrocada do partido diante do Tempo Novo.

Ninguém é perfeito, menos ainda na política. Maguito era assim, tocado pelas picuinhas do dia a dia, sempre superficial e distante, impenetrável pelo tom cortês com que pautava suas relações. Fez gestões e mandatos sem realizações capazes de chamar a atenção da História (a não ser pela desastrosa venda da usina de Cachoeira Dourada, maior erro que um gestor estadual já cometeu em Goiás). Porém, com os retoques que a sua biografia ganhou após a sua morte, vai acabar dando a Goiás uma contribuição da máxima importância. Ser “conciliador” e “pacificador” agora são atributos notáveis para qualquer liderança. Entrou na moda. Em especial, no caso filho Daniel Vilela, que com certeza contempla hoje a transferência do pai para a eternidade e o que ficou de alegoria como um reflexo do seu próprio destino na política. Menos impulsividade. Menos frieza. Mais humanidade. Ele pode e deve, sim, assumir o figurino que o marketing da posteridade está vestindo em Maguito. Já está convivendo com Caiado, a quem, depois da eleição de 2018, só dirigia críticas e alfinetadas irônicas. Cabe a ele ser mais que o pai e ir além de posar sorridente ao lado de governantes de outros partidos, como as fotografias que Maguito foi pródigo em produzir no período em que estava na prefeitura de Aparecida e Marconi Perillo no Palácio das Esmeraldas, em uma espécie de “conciliação” e “pacificação” de fachada. Daniel Vilela vai querer? Ninguém sabe. Mas, para honrar o legado arranjado para o pai, o caminho é esse.