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José Luiz Bittencourt sobre política, cultura e economia

20 ago

Mendanha falhou como prefeito de Aparecida, não cumpriu nenhuma das promessas de campanha e agora repete a dose no Plano de Governo que registrou no TRE: não acreditem, leitoras e leitores

Conta Plutarco que, certa vez, Licurgo caminhava pelas ruas de Esparta quando observou um amontoado de pessoas ao redor de um homem que vociferava em cima de um caixote. O legislador se aproximou para ouvir o discurso do cidadão, conhecido seu, que bradava contra a austeridade da Cidade-Estado, afirmando que a cultura belicosa que ali se desenvolvia formaria habitantes agressivos demais para uma boa convivência em sociedade. Licurgo tomou a palavra e contou ao público que aquele homem tratava seus filhos, esposa e servos com brutalidade, sendo intolerante com as mais minúsculas de suas falhas. Proferiu então sua famosa réplica: “Quem propõe mudança, deve começar dentro da sua própria casa”. A multidão se dispersou.

Essa parábola, digamos assim, é contada pelo advogado Jales Naves Jr. em artigo no site A Redação, do abalizado João Unes. Recorro a ela para orientar a avaliação do Plano de Governo registrado na Justiça Eleitoral pelo ex-prefeito Gustavo Mendanha junto com os documentos necessários para oficializar candidatura a governador. Mendanha faz uma série de propostas cuja credibilidade deve ser medida por dois parâmetros: a viabilidade operacional/financeira e os antecedentes que tem como gestor público, já que dirigiu o segundo maior município de Goiás, Aparecida, por cinco anos e três meses, e daí sendo possível extrair até onde vai a sua capacidade administrativa. 

Sobre viabilidade, o próprio Mendanha confessa que desconhece o orçamento que deseja comandar. Constrangido, mas despudoradamente, disse isso a uma rede nacional de televisão, a Jovem Pan. Está claro, portanto, que ele não tem noção das possibilidades ou não do enquadramento dos seus projetos dentro das receitas e despesas do Estado. Pode-se concluir, daí, que o Plano de Governo protocolado no TRE é muito mais um instrumento de campanha, de marketing, do que planejamento sério e responsável.

Mesmo assim, a leitura do documento permite uma comparação com o comportamento do candidato quando cuidou – ou descuidou – de Aparecida. Os arquivos do TRE guardam os dois planos de governo que Mendanha entregou na primeira campanha para prefeito, em 2016, e na segunda, em 2020. São textos resumidíssimos, com poucas páginas e menos explicações ainda, apenas com listagens de intenções ou promessas sintetizadas, porém levando a uma constatação inequívoca: do que está lá de concreto, relevante e significativo, nada – e não é exagero – nada foi cumprido.

Vou citar aqui um compromisso que o próprio Mendanha estabeleceu para o seu primeiro mandato e repetiu quanto ao segundo: asfaltar todos os bairros de Aparecida. Não chegou perto. Há dezenas de setores na cidade clamando por esse que é o benefício civilizatório número um em qualquer comunidade brasileira. O atual prefeito, Vilmar Mariano, continua prometendo a mesma coisa, com um enunciado diferente: pavimentar todas as ruas habitadas. Em reuniões na periferia, ele foi vaiado quando repisou essa conversa fiada.

Vamos a outros itens: construir um hospital do câncer, instalar um banco de alimentos, criar um programa para a realocação de desempregados, construir um centro olímpico, construir mais postos de saúde e reformar os existentes, abrir as avenidas do Eixo Leste-Oeste, implantar três parques ecológicos, resolver o déficit de vagas nos CMEIs, implantar o programa “cidade inteligente” construir 3.000 casas e ampliar a ajuda às famílias em vulnerabilidade. Tudo isso, leitoras e leitores, tornou-se agora um vexame sem tamanho para Mendanha. Ele não avançou em nada. Hoje, 33 mil crianças estão sem vagas nos CMEIs de Aparecida. Das cinco avenidas, uma foi inaugurada inacabada. Unidades habitacionais, fez menos de 100. A estrutura física dos postos de saúde mergulhou no caos. Quanto ao resto, é um zero enorme à esquerda. Durante todo o seu governo, com a mulher Mayara na pasta da Assistência Social, Mendanha não deslanchou com um único programa social em caráter permanente. É inacreditável: em meio a uma população com quase 70 mil carentes no CadÚnico da União, a prefeitura de Aparecida não tocou um único projeto de solidariedade com o próximo. O máximo que fez foi distribuir cestas básicas doadas por empresários, sem periodicidade. Ah: também deu caixas de papelão para substituir o berço para bebês de mães pobres, uma imprudência. Dá até para dizer que o casal Mendanha não mostrou a menor empatia com os desfavorecidos que ajudaram a colocá-lo no poder.

O caso da “cidade inteligente” é de chorar. O que foi prometido: hot-spots em praças públicas, sistemas de reconhecimento facial, prontuário médico eletrônico, investimento maciço em telemedicina e em teletrabalho, interfaces online para todos os serviços públicos municipais e aplicação maciça de tecnologia por todo lado. Lembrando que, somente isso, não basta para uma “cidade inteligente”, que exige muito mais. O que foi feito: uma sala com telas de led para receber imagem de câmeras espalhadas por ruas e escolas. Só e mais nada. Um logro monumental, que o candidato se propõe a transferir para o governo de Goiás, através de um tal “Estado Inteligente” que mais ofende as goianas e os goianos do que sinaliza algum passo adiante um dia.

A exemplo da réplica de Licurgo, as propostas de Mendanha têm que ser passadas pelo pente fino do que ele realizou “dentro da sua própria casa, o seu portfólio. E aí seu Plano de Governo perde a sustentação e a ser visto como o que realmente é: peça de ficção. Uma ilusão a ser vendida aos incautos, como as eleitoras e os eleitores aparecidenses que compraram a ilusão oferecida nas duas campanhas para a prefeitura e votaram maciçamente em um jovem da cabeça velha, demagogo da pior cepa e despreparado para a arte de governar. Goiás, desde a redemocratização, há 40 anos, nunca escolheu um governador com esse perfil, ao contrário, consagrou homens como Iris Rezende, Henrique Santillo, Maguito Vilela e Marconi Perillo. Até Alcides Rodrigues, com toda a sua estreiteza, foi melhor.