Entrevista quilométrica de Marconi a O Popular ainda está longe da autocrítica que ele continua devendo e traz só mágoas em vez de alguma proposta para Goiás, obrigação de quem foi governador 4 vezes
A caudalosa entrevista que O Popular arrancou do ex-governador Marconi Perillo apenas confirma a continuidade dos equívocos de alguém que se hospedou por 4 mandatos no Palácio das Esmeraldas, de certa forma chegou a ser grande e considerado quase que um semideus da política estadual, mas perdeu a compreensão do seu papel na história de Goiás – afinal, o que se lê são manifestações de mágoas pessoais e uma formulação conspiratória dos fatos que levaram à ruína da sua carreira, na verdade consequência de ações produzidas por uma visão distorcida que marcou os últimos anos do PSDB no poder e o trágico desfecho que veio com as eleições de 2018, quando ele, Marconi, ficou em 5º lugar para o Senado e seu poste José Eliton terminou em 3º para o governo.
A jornalista que entrevistou Marconi foi camarada. Avançou em questões até então intocadas pelo ex-todopoderoso, porém aceitou sem retrucar as respostas irreais, não só para quem lê o material, como também para o próprio ex-governador – mergulhado em confortável autoengano, de onde partem explicações ilusórias para o buraco aonde a sua liderança foi arrastada. Continua faltando uma autocrítica, com o reconhecimento de que, em sentido contrário ao que afirma o título escolhido por O Popular, o PSDB tem, sim, do que se envergonhar.
Não, Marconi não foi derrotado nas urnas, massacrado, melhor dizendo, em 2018 por uma conjuração maquiavélica dos seus adversários, do governador Ronaldo Caiado e do Ministério Público. Isso é conto da carochinha. Sem os eventos policiais que o envolveram, na época, o fiasco chegaria da mesma forma. Havia um acúmulo de casos de corrupção que vinha de longa data nas suas gestões, por um lado, e uma inexorável ruptura política a caminho, daquelas que periodicamente acontecem em Goiás – produzidas pelo cansaço do eleitorado com os mesmos atores em cena – e beneficiaram até a ele mesmo, em 1998, quando a vítima da vez foi o então onipotente Iris Rezende. Dentro da base comandada pelo PSDB, vozes como a de Vilmar Rocha já alertavam desde 2015 para a fadiga das goianas e dos goianos diante de um modelo de governo que não se renovava e procurava se perpetuar com os mesmos desgastados nomes e a falta de projetos de sempre.
Esse assunto foi o escopo da entrevista, em alguns momentos constrangedora, como quando, por exemplo, Marconi admitiu práticas de caixa 2, só que tentando livrar as suas campanhas – inutilmente, já que está inclusive condenado em um dos processos a que responde por esse tipo de delito, no caso sentenciado pela Justiça Eleitoral a 1 ano e 8 meses de prisão, detalhe da maior importância que a jornalista convenientemente ignorou na inquirição do ex-governador. A pena foi convertida em prestação de serviços comunitários, encontrando-se, no momento, sob recurso para o 2º Grau.
Da mesma forma, não se pode levar a sério o que Marconi diz de Caiado, um falatório que na verdade mostra dor de cotovelo e passa longe de configurar uma crítica séria e honesta ao trabalho do atual governador, cuja gestão não se resume a trocar nomes de programas antigos, coisa em que o próprio entrevistado, nas suas administrações, fez repetidamente em relação ao que recebeu do PMDB. Caiado, goste-se ou não dele, é responsável por uma mudança de paradigmas administrativos sem precedentes em Goiás, o mais importante deles a recuperação da simetria entre receitas e despesas – cujo desequilíbrio brutal talvez tenha sido o fator que mais corroeu os mandatos tucanos no Estado. Isso dá ao seu governo uma dimensão semelhante ao de Mário Covas, em São Paulo, que reorganizou as finanças do Estado há mais de 20 anos, trabalho que perdura com solidez até os dias hoje.
Do que se aproveita na entrevista de Marconi, salta uma conclusão: ele segue vivendo no passado, saudoso dos bons tempos em que mandava e desmandava e que, a depender do que sai da sua boca, dificilmente voltarão.