Entendendo Caiado: oposição à reforma tributária não é ideológica ou eleitoreira, porém apenas defesa de Goiás
O governador Ronaldo Caiado ganhou projeção nacional com a oposição enfática que fez – e continua fazendo – no caso da reforma tributária. Apressadinhos obsessivos enxergaram na ação do governador um reles alinhamento com o bolsonarismo para antagonizar o governo Lula e buscar sintonia eleitoral com o gado. Isso foi distorcidamente relatado por gente graúda da imprensa estadual, em uma espécie de visão reducionista da movimentação de Caiado contra a nova ordem fiscal – em momento algum fora do seu único e exclusivo conteúdo, ou seja, a defesa intransigente dos interesses de Goiás.
Em uma página, critica-se Caiado por se alinhar com o bolsonarismo. Em outra, estampa-se uma bela e longa entrevista na qual ele enumera seus argumentos para atacar o projeto aprovado a toque de caixa pela Câmara Federal, desfigurado por ajustes de última hora para facilitar o aval da maioria dos deputados federais, ao custo de R$ 1,2 bilhões de dólares em emendas. Se era mais ou menos bom, no início, agora se tornou péssimo. Haveria só uma alíquota para o IVA, agora são várias. Exceções, que também não existiam, passaram aos montes. Um conselho ironicamente chamado de “federativo” foi instituído em completo desrespeito ao pacto constitucional, com autoridade para arrecadar e distribuir o imposto, reduzindo a pó a autonomia de governadores e prefeitos. Nesse colegiado, Estados do Sul e Sudeste terão maior peso nas votações. Um verdadeiro Frankenstein jurídico, enfim, que até os economistas inicialmente a favor deixaram de apoiar e hoje fazem reparos aos borbotões.
É fácil entender a pregação de Caiado como adversário da reforma tributária. Para perseverar na missão da sua vida e cuidar bem das goianas e goianos, o governador estudou a fundo o assunto e se tornou um especialista. As entrevistas a O Popular e à Folha de S. Paulo, após aprovada a matéria, transbordam em contribuições sobre um regime de impostos adequado para o Brasil, sem prejudicar nenhum Estado ou município (leiam a de O Popular aqui). Não há nada de ideologia ou de exploração eleitoral, visando a uma eventual candidatura presidencial. Caiado fala de Goiás. Da sobrevivência de um Estado hoje fiscalmente saudável, a ser transformado em um ente “subSudeste” com a implementação da reforma, como a maioria. Felizmente, pode não acontecer: a etapa a percorrer no Senado não parece mais o mar de rosas imaginado a princípio, com o surgimento da oportunidade para uma revisão redentora.
Se não for assim, Goiás será forçado a se dobrar de joelhos no conselho federativo controlado pelos Estados abaixo no mapa a partir de São Paulo. Aberração. Nossos fundos de investimentos e proteção social, como o Protege e o Fundeinfra, vão desaparecer. O próprio Fundo Constitucional do Centro está ameaçado. A Lei Goyazes, de estímulo à cultura, irá para o saco. Não haverá mais incentivos para a industrialização. De resto, o IVA terá uma alíquota real de 35% e não os previstos 25%, pelas contas de Caiado, a depender do formato de cálculo. As empresas estaduais de bens e serviços serão pesadamente oneradas e enfrentarão uma onda de falências, além dos inevitáveis prejuízos aos consumidores com a alta de preços. Não é de se descartar uma debandada das indústrias que chegaram de fora para operar em Goiás, como as de Anápolis e Aparecida. Esse é o cenário traçado por Caiado, com conhecimento de causa. Está lá, com fartura de dados, na entrevista de O Popular (pela importância, vou repetir o link, leiam aqui).
Mesmo sob essas luzes, escrevem-se baboseiras para diminuir a profundidade e o peso de tudo o dito pelo governador para sustentar suas opiniões. É “reaproximação” com o bolsonarismo e busca de vantagens para a eleição marcada para daqui a mais de três anos. Apresentar aos leitores um quadro desenhado com tintas tão negativas é má fé e um desserviço ao Estado. E isso quando grande imprensa se debruça com lupa sobre o texto aprovado e detalha contradições, incorreções e omissões que não poderiam jamais estar ali criando insegurança jurídica e econômica. Já se aponta a possibilidade de um regramento fiscal muito mais danoso e prejudicial para as brasileiras e os brasileiros do que o atual. Mostram-se as brechas abertas para que grupos poderosos, sobretudo da indústria, imponham suas vontades – ganhar mais dinheiro – sobre o conjunto da população. Não dá para ignorar. Caiado, corretamente, propõe o debate certo e indispensável para o momento. Mas ainda não chegou ao fim, ele tem um papel estratégico e decisivo a desempenhar e é o que se verá nos próximos meses.