Tudo o que Caiado adiantou que o governo federal faria, em relação a Goiás, não se concretizou e por isso esperar medidas contra a Enel ou retomada da Celg é sonho de uma noite de verão
Corre um noticiário intenso sobre a probabilidade de medidas do governo federal contra a Enel, que iriam desde uma revogação da concessão para explorar a distribuição de energia em Goiás até a devolução da Celg ao governo do Estado. Logo após mais uma das suas tantas visitas a Brasília, o governador Ronaldo Caiado anunciou bombasticamente que teria obtido o apoio do presidente Jair Bolsonaro para imprensar a companhia contra a parede e fazê-la alvo de decisões radicais – como, por exemplo, uma intervenção ou, no limite, a sua expulsão do território goiano.
Isso não vai acontecer. Tem cheiro de bravata aí, leitora e leitor. A administração do setor elétrico, no Brasil, é guiada por motivações 100% técnicas. A influência política é zero. Se Caiado e a maioria dos goianos estão insatisfeitos com a Enel, isso jamais levaria a uma reversão de um processo de privatização que, no final das contas, comprometeria a imagem do Brasil pelo mundo afora. Sem falar que a venda da Celg foi cercada de um aparato de segurança jurídica que dificilmente poderia ser quebrado um dia. Não à toa, a atual proprietária – italiana – é uma corporação de renome mundial, listada na Bolsa de Nova Iorque. Aliás, há poucos dias, seus representantes estiveram lá para falar sobre seus investimentos brasileiros, hoje acima de R$ 15 bilhões de reais.
Não é pouca coisa. Uma arremetida do governo federal contra a Enel teria repercussão mundial e afetaria a imagem do país quanto as privatizações que o presidente Jair Bolsonaro pretende fazer, a principal da quais já está programada e é justamente no setor elétrico: a Eletrobrás. Não deve demorar. Mas, se algo afetar as relações com a Enel, as consequências seriam drásticas, a partir da perda da confiança do mercado internacional sobre a capacidade do Brasil de honrar seus compromissos e contratos assinados. Pior: os relatórios oficiais sobre o desempenho dos serviços prestados em Goiás são contraditórios. Há boas e más avaliações.
Quando a CPI sobre a Celg-Enel foi aberta na Assembleia, o então presidente do BNDES Joaquim Levy ligou para Caiado para reclamar, argumentando com uma possível repercussão negativa para o governo Bolsonaro. Isso mostra o quanto é delicada a questão. De resto, tudo o que Caiado adiantou, até hoje, sobre providências esperadas de Brasília para atender a revindicações suas, não se efetivou. Pior ainda: Bolsonaro jamais disse que vai apoiar a retomada da Celg pelo governo de Goiás. Essa foi uma conclusão apressada de um encontro que o governador teve com um general que ocupa uma secretaria no Palácio do Planalto, sem nada a ver com a administração do setor elétrico. Vá lá: se Bolsonaro o tivesse mesmo dito, o que isso seria além de mais uma das impropriedades sem consequência prática a que é dado.
P.S – Agradeço a citação do jornalista Nilson Gomes ao meu nome, em seu artigo no Diário da Manhã sobre a devolução da Celg para o governo de Goiás. Em especial, registro que ele me separa do blog Goiás24Horas, com o qual, de fato, não tenho nenhuma ligação, mesmo porque faço questão de assinar a minha opinião sem nenhum condicionante que não a minha própria consciência. Diz a historiadora autodidata Barbara Tuchman que um jornalista sem posição “seria como um vegetal”. Concordo e a leitora e o leitor que me acompanham sabem que jamais abordei qualquer assunto sem expressar um ponto de vista intimamente ligado à minha visão do mundo e sem amarras de qualquer ordem. É assim que penso e esse é o meu compromisso. Já estou adiantado demais na vida para me submeter, por dinheiro ou ou outro tipo de acerto, a qualquer paixão, o que só é possível graças às maravilhas da internet e da livre difusão da informação nos incríveis tempos de hoje. Sigo em frente.