Sem conseguir justificar seus privilégios, saída dos empresários beneficiados pelos incentivos fiscais é falar mal da CPI, atacar o relator Humberto Aidar e ameaçar com a desindustrialização do Estado
O que era para ser um debate normal, democrático e necessário neste momento, que, a propósito, está se repetindo na maioria dos Estados brasileiros, sobre a política de incentivos fiscais em Goiás, através da CPI dos Incentivos Fiscais – prerrogativa de que a Assembleia não pode abrir mão -, evoluiu para se transformar, por conta da reação estapafúrdia dos empresários beneficiados pelos excessos da distribuição a torto e direito de isenções de ICMS nos últimos 20 anos, em um espetáculo deprimente.
É um circo o que o Fórum Empresarial está promovendo para a suposta defesa dos interesses dos seus associados, ou seja, das 534 grandes pessoas jurídicas estaduais que seguram em seus cofres, anualmente, cerca de R$ 10 bilhões de reais que seriam devidos caso fossem obrigados a pagar ICMS como as demais empresas instaladas no Estado. Até hoje, não foi apresentado um único argumento de qualidade para justificar essa regalia indecorosa, além de ataques à CPI, agressões ao deputado Humberto Aidar, do MDB, seu relator, e chantagem pura e simples, na forma de ameaças quanto a uma eventual desindustrialização da economia goiana – um blefe sem tamanho.
É coisa de picadeiro o ex-deputado Sandro Mabel, por exemplo, debochar de um Poder Constituído prometendo fazer uma greve de fome no saguão do prédio da Alameda dos Buritis, caso não seja ouvido pela CPI – e não o será porque Aidar já deixou bem claro que as investigações se dão a respeito de fatos objetivos que envolvem diretamente as maiores empresas do Estado, cujos felizes proprietários estão sendo chamados para depor. Mabel não é empresário. Já foi, alienou o que tinha, entregando junto um pacotaço de incentivos fiscais que provavelmente valorizou o preço de venda da sua fábrica de biscoitos e, portanto, não tem que usar a CPI como palanque para posar de paladino do desenvolvimento econômico regional, na condição – que não deixa de ser estranha – de um sem-indústria que preside a Federação das Indústrias. Outro, um tal de Chequinho (seria Edwal Portilho, um dos diretores da Adial), anunciou que, por conta das apurações da CPI, estaria sendo criado um clima de desestímulo aos negócios capaz de transformar o próximo Natal em um dos piores da história para os goianos – afirmação que a boa educação recomenda que não seja aqui adjetivada da forma conveniente.
Isso não é sério. O que se assiste é preocupante: como é que os maiores capitalistas do Estado, homens que sustentam o grosso do PIB goiano, se comportam de maneira tão infantil e de certa forma tão irresponsável, recusando-se a prestar contas e a jogar luz sobre o dinheiro público – sim, incentivos fiscais são inteiramente dinheiro público – que recebem para produzir? Como se sabe, a concessão dessas regalias sempre se deu sob sete chaves e jamais teve um único documento publicado no site da transparência do governo do Estado. Nem um único. Olhem, leitora e leitor, o que o relator Humberto Aidar diz sobre isso: “Quem contrata com o Estado tem que abrir as portas. O dinheiro é do povo. Não tem motivo de ficar às escondidas. Nem todas as empresas que cresceram ao longo desses anos foram só à base de trabalho e talento. Teve o dinheiro do povo”. Ninguém precisa pensar muito para reconhecer que o deputado está 100% certo.
E o mais grave é que teve mais dinheiro do que se imagina. Nos últimos 20 anos, possivelmente uma fábula correspondente a R$ 500 bilhões, segundo cálculos conservadores. Ao certo, ninguém sabe. O que a CPI pretende, como instrumento da soberania do Legislativo, que por sua vez é o representante mais legítimo da população na esfera institucional do Estado, é descobrir o que há por trás dessa montanha de dinheiro. Não haveria nada de mais. No entanto, com a gritaria descontrolada dos empresários privilegiados pelos incentivos fiscais, é legítima a suspeita de que há muita coisa errada e, principalmente, interesse em esconder.