Caso de polícia: em Goiás, grandes indústrias pagam menos ICMS que uma microempresa do Simples e ainda ganham mais dinheiro com créditos tributários do que com a produção de mercadorias
Sob o comando do destrambelhado presidente da Federação das Indústrias Sandro Mabel, que não se cansa de falar besteiras incompatíveis com o cargo que ocupa, a reação do megaempresariado estadual diante do questionamento que se faz hoje da política de incentivos fiscais dos últimos anos tem um motivo fácil de entender: o que está em jogo em jogo é uma mamata que nunca se viu antes, não é exagero, em qualquer parte do mundo, em que grandes conglomerados não pagam um centavo de impostos para operar em Goiás e ainda ganham dinheiro, muito dinheiro, com créditos tributários – em alguns casos mais do que produzindo mercadorias.
Não é este blog quem afirma. É alguém que é do ramo e tem credibilidade para dar e vender: o senador Vanderlan Cardoso, ele mesmo um megaempresário que usufrui de incentivos fiscais, mas reclama das distorções que se tornaram regra a partir da docilidade do ex-governador Marconi Perillo quanto a atender aos interesses dos maiores capitalistas do Estado. Veja aqui as revelações e a opinião de Vanderlan sobre a farra da distribuição descabelada de isenções de ICMS e como essa estratégia de desenvolvimento foi deturpada, a ponto de passar a ser a maior fonte de faturamento de muitas indústrias goianas, mais que a sua própria produção, sem falar nas fraudes praticadas a torto e a direito.
É um escândalo. Um caso de polícia. Que só foi desvendado graças à insistência da CPI dos Incentivos Fiscais, enfrentando até ameaças físicas – como ocorreu com o seu relator deputado Humberto Aidar. E graças a ele há um debate posto hoje em Goiás sobre o tema, apesar da recusa dos beneficiados em se aprofundar na questão e do receio que têm de perder seus privilégios. Não é assim que funciona. Os grandes industriais que se lambuzam com regalias tributárias correspondentes a uma renúncia de arrecadação de R$ 10 bilhões por ano, se tivessem a consciência tranquila, não se furtariam ao dever de prestar contas sobre o dinheiro público que meteram nos próprios bolsos, em vez de recolher aos cofres do Estado como qualquer outro contribuinte obrigado a fazê-lo.
Sim, empresários portentosos pagam, em Goiás, menos impostos que pequenas empresas submetidas ao regime do Simples. Não há nada mais indecente. E, quando se ouve o palavrório sem sentido do líder deles, Sandro Mabel, é que se constata que não têm argumentos para justificar as benesses que recebem. Provavelmente, não há nenhum em dia com as contrapartidas a que se comprometeram quando ganharam a dádiva de se livrar do ICMS. Em 2015, a então secretária da Fazenda Ana Carla Abrão Costa auditou as 60 maiores empresas incentivadas e não encontrou uma só em situação de regularidade. Corretamente, suspendeu as vantagens que elas tinham, mas o mundo veio abaixo. Pressionado e acuado, Marconi determinou um recuo e tudo ficou na mesma, ou seja, a punição foi retirada, não se falando mais no assunto.
Isso precisa acabar. Incentivos fiscais são parte de qualquer projeto de crescimento econômico, em qualquer lugar, não há dúvida. Parte, não tudo, como o que passou a acontecer em Goiás, com reflexos até na falta de competitividade da economia estadual – em queda contínua e sem nenhum escopo de inovação & tecnologia, segundo o último ranking divulgado.