Debates perdem conexão com propostas e só servem para avaliar biografia e preparo pessoal
A história dos debates no Brasil mudou: se, teoricamente, foram criados para abrir espaço para a discussão de propostas, agora perderam essa característica para se renovar como um mecanismo para a avaliação do preparo pessoal de cada candidato. Como ele reage a situações inesperadas, como lida com agressões, que saídas encontra para perguntas difíceis e principalmente qual o seu escopo emocional para lidar com crises – um resumo, enfim, de tudo o que enfrentará se vencer a eleição e daí assumir o poder.
Debater ideias é papo furado. Ninguém aguenta. De resto, como alguém seria capaz de resumir em 90 segundos a sua proposta para algo tão amplo como a Saúde ou a Educação? É ridículo. E o que contrapor sobre colocações dos adversários em tréplicas de 30 segundos? É melhor – e mais atrativo para o público – partir logo para especular sobre a biografia do antagonista, suas contradições, itens polêmicos da sua trajetória de vida e conexões às vezes constrangedoras com lideranças maiores e menores envolvidas nas candidaturas.
Isso já está acontecendo em São Paulo, comprovando: por esse caminho, pode-se alterar o perfil das pesquisas em uma semana – e capturar as antenas da sociedade. Foi assim, com participação em apenas dois debates, que o coach goiano Pablo Marçal saltou nas intenções de voto para dividir em empate técnico o 1º lugar com o prefeito Ricardo Nunes e o psolista Guilherme Boulos, imprensando as campanhas de ambos contra a parede. Marçal mostrou o caminho. Como é que, em Goiânia, ninguém perguntou a Adriana Accorsi sobre o apoio descarado do PT a Nicolás Maduro? E Vanderlan Cardoso, que vem passando incólume pelos desgastes inevitáveis da candidatura da sua mulher Izaura em Senador Canedo? Ou Fred Rodrigues, que perdeu – e não foi à toa – um mandato de deputado estadual? Rogério Cruz, nem se fala, com as dezenas de denúncias do Ministério Público sobre a sua gestão. Sandro Mabel não é um campeão de polêmicas ao longo da sua carreira política? É. Mas os debates se sucedem e nenhum deles interpela para valer os outros. É muito mamão com açúcar, mutuamente.
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Atenção, leitoras e leitores: não é só uma questão de atacar. Os pretendentes ao Paço Municipal merecem uma chance para se explicar sobre os pontos nocivos ou duvidosos dos seus currículos, digamos. Por conta deles próprios, vão achar melhor se omitir e enrolar, ganhando tempo. Só que o eleitor tem o direito de saber de tudo. Pelo ritmo atual da festa eleitoral no maior colégio de votos do Estado, não vamos chegar perto. Os debates, até o momento, foram frustrantes ao deixar temas relevantes em aberto, quase todos relacionados com o perfil individual dos candidatos – e essas são informações fundamentais para formar os números que as eleitoras e os eleitores teclarão nas urnas eletrônicas. Propostas têm pouco a ver com isso – aliás, elas são em última análise as mesmas nos planos de governo apresentados pelos candidatos, geralmente declarações vazias de intenção e sem quaisquer argumentos de viabilidade.
O Brasil mudou e devemos comemorar. As eleições em curso em Goiânia, não. O cenário eleitoral montado para o próximo 6 de outubro é uma réplica dos registrados nos último 30 a 40 anos. Todos os candidatos são fracos, o que é atestado pela baixa pontuação comum nas pesquisas. “Padrinhos” envolvidos são muito mais interessantes, como é o caso do patrocinador de Mabel, o governador Ronaldo Caiado, tido unanimemente como um atalho potencialmente para o Sandro e se classificar para o inevitável 2º turno. Enquanto isso, no ritmo observado nos debates já realizados, trata-se de um instrumento valioso desperdiçado por todos os aspirantes ao Paço Municipal, sem exceção. Não é bom.