Três fatores inviabilizam a formatação de uma base confiável para Caiado na Assembleia: a falta de poder de Ernesto Roller, a arrogância dos secretários de fora e a caderneta da primeira-dama Gracinha
É bem possível que o governador Ronaldo Caiado já tenha tomado ou esteja perto de tomar uma decisão inusitada: vai tocar a sua gestão sem apresentar projetos de importância à Assembleia Legislativa, onde, hoje, não tem a certeza de que consegue aprovar qualquer coisa, dado o clima hostil entre o Palácio das Esmeraldas e os deputados estaduais.
É quase impossível governar assim. Mas Caiado parece não ter opção. Do que ele fez até agora para conquistar o apoio do Legislativo, nada deu certo. Nem mesmo apelar para o apetite fisiológico dos parlamentares, oferecendo cotas de R$ 30 mil em nomeações e direito a indicação de duas diretorias ou superintendências. Muitos aceitaram, inclusive gente da oposição, como os deputados Diego Sorgatto, do PSDB, ou Virmondes Cruvinel, ex-PPS e atual Cidadania, e Tiago Albernaz, do Solidariedade, esses dois últimos antigamente ligadíssimos ao ex-governador Marconi Perillo. Mesmo assim, o destino de eventuais matérias de importância que venham a ser submetidas à Assembleia continua incerto, obrigado o governo a adiar temas estratégicos como a segunda parte da reforma administrativa.
Três fatores atravancam a formatação de uma base de apoio legislativo a Caiado. O primeiro é a falta de poder do secretário de Governo Ernesto Roller, encarregado das negociações com os deputados. Roller não tem poder de decisão e precisa, a cada passo, submeter seus acertos a apreciação superior, no caso a primeira-dama Gracinha, encarregada informal de receber, avaliar e tornar realidade, quando achar que deve, as indicações recebidas. Além disso, o secretário padece de uma crise de relacionamento com o deputado Iso Moreira, com quem disputa penetração no nordeste goiano. Iso e Roller são adversários figadais, que não trocam nem um cumprimento educado. E, para azar do secretário, Iso é hoje o mais eficiente conspirador dos bastidores da Assembleia, tanto que foi nomeado líder do recém-criado bloco independente, que pretende se comportar nem como governista nem como oposicionista, mas exatamente como o nome indica, ou seja, de modo autônomo, o que é um mau sinal para o governo.
O segundo obstáculo para o advento da tal base na Assembleia é o desprezo que os secretários que vieram de fora, a maioria no governo Caiado, dedicam aos deputados. Uns, por falta de experiência e conhecimento da política estadual. Outros, por arrogância mesmo. Amontoam-se casos em que nomes recomendados pelos parlamentares foram nomeados, porém em seguida rechaçados – o que, por exemplo, aconteceu na Saneago, onde o presidente Ricardo Soavinski recusou-se a dar posse a indicados de deputados (e até do governador – leia mais aqui), ou na Secretaria de Comunicação, que teve um irmão do deputado Humberto Aidar aboletado para uma superintendência, mas depois colocado para fora pela titular da pasta Valéria Torres.
A primeira-dama Gracinha Caiado e a sua inseparável caderneta, onde registra cuidadosamente cada sugestão não só dos deputados, como também dos políticos em geral, é o terceiro ponto a emperrar a definição de uma maioria pró-Caiado na Assembleia. Ela anota, mas não dá garantia de que haverá uma solução e só avança com o que acha válido para o governo e para o marido. Muitos deputados estranham que a primeira-dama tenha essa função e menos ainda se sentem à vontade para apresentar as suas listas – que Gracinha, por sua vez, também não recebe sem um olhar de quem acredita que essa é uma prática da “velha política” que precisa ser varrida do Estado. Ao delegar responsabilidades políticas para a própria mulher, Caiado impôs a si próprio um risco elevado. Além de expô-la, esqueceu-se que ela é, digamos assim, uma figura reverencial, pelos seus laços matrimoniais, que a revestem de uma aura virtuosa e sagrada. Quem ousaria reclamar ou incomodá-la para discutir pleitos não atendidos ou picuinhas municipais e se arriscar a tomar uma reprimenda de caráter pessoal do governador?
Tudo isso somado, deu no inevitável. O governo Caiado está totalmente fragilizado na Assembleia. Começa assim, perdendo votações e levando tropeções de maior ou menor tamanho. Mas onde termina é que mora o perigo.