Crise na prefeitura de Goiânia(7): argumentos do MDB para romper com Rogério Cruz mostram confusão mental, passam por contradições e vão até a invencionice pura e simples
Uma série de oradores e discursos quilométricos marcaram a cerimônia do adeus em que o MDB se despediu da cargaria que ocupava na prefeitura de Goiânia, onde controlava o orçamento, o preenchimento de cargos comissionados e a agenda do prefeito Rogério Cruz – dizia-se que era vigiado pelos seus “carcereiros” até quando ia ao banheiro. Um arranjo esdrúxulo como esse, imaturamente montado sob o impacto emocional da morte do prefeito eleito Maguito Vilela, jamais, em parte algum, em qualquer época, conseguiria se sustentar, por se basear na derrocada da autoridade do mandatário maior do sistema de poder municipal encastelado no alto do Park Lozandes.
Mesmo assim, acabou antes do tempo previsto, que até o presidente estadual do MDB Daniel Vilela chegou a admitir que seria de um ano. Como é que um chefe do Executivo governaria sem contar com nomes da sua confiança estrita na sua equipe de auxiliares? Ou sem implantar a sua própria concepção de gestão? A extensa carta-testamento do partido, ao ser jogada do barco de Rogério Cruz, alinha argumentos desconexos, mas pelo menos é sincera e honesta nesse ponto, ao reconhecer, textualmente, que “um governante tem o direito natural e legítimo de escolher auxiliares mais próximos, do ponto de vista político e pessoal”.
Foi o que aconteceu, junto com uma operação bem montada para recuperar a administração do orçamento de Goiânia e o controle sobre as centenas de cargos comissionais sobre os quais o MDB havia avançado, em prejuízo, por exemplo, dos vereadores, aqueles que têm na cabeça a certeza de que a governabilidade deve ser paga com a moeda da inclusão dos seus parentes apaniguados na folha de pagamento – a mesma que Daniel Vilela e os seus colegas de partido haviam reservado para o seu usufruto particular e à qual acrescentaram mais de 300 sinecuras bem remuneradas na “reforma administrativa” que passaram em dezembro, aliás muito impropriamente em nome do então paciente em estado terminal Maguito Vilela.
A carta-testamento dos ex-secretários emedebistas cita genericamente o famoso e inexistente “plano de governo” de Maguito, cujo descumprimento seria o crime capital de Rogério Cruz. Não é verdade. Primeiro, por que o tal “plano”, que segundo o texto emedebista seria “manter a cidade no caminho da modernização, com melhorias na mobilidade, na educação, na saúde, no desenvolvimento econômico e na garantia da continuidade das várias conquistas da gestão de Iris Rezende”, acrescentando que “tudo isso casado com uma plataforma de amparo social, marca indelével da trajetória de Maguito”, não é nada disso, apenas um amontoado de propostas eleitoreiras, inclusive a promessa de dar continuidade às obras de Iris Rezende – 89 novas entregues ao seu sucessor inconclusas e com um passivo financeiro impossível de ser coberto sequer a médio prazo. O novo prefeito até que tornou realidade, em tempo recorde, o IPTU Social e a Renda Família, programas fajutos de apoio às goianienses e aos goianienses em situação de vulnerabilidade, criados na época da campanha para angariar votos dos incautos. É, portanto, ao contrário do que o MDB afirma.
Fora a cesta básica, desmoralizada pelos governos de Marconi Perillo ao instituir o cartão magnético do Renda Cidadã, esse hoje também superado tal como foi concebido, ninguém é capaz de citar qualquer outra iniciativa das gestões passadas de Maguito que possa fundamentar que “uma plataforma de amparo social” seria “a marca indelével da trajetória de Maguito”. Isso é uma fantasia, uma tentativa de falsificar a história. Não é porque morreu que um político tem que ser transformado no que nunca foi e receber o galardão de uma grandeza que não teve.
As contradições e os equívocos do MDB na crise com Rogério Cruz dão fartura de panos para mangas. As críticas a novos secretários da prefeitura que vêm de fora são inaceitáveis (veja sobre auxiliares do governador Ronaldo Caiado que vieram de fora e deram muito certo aqui). Em um ato falho e mostrando confusão mental, Agenor Mariano, agora ex-secretário de Planejamento Urbano, lembrou que é neto de um imigrante que veio a pé para Goiás, diretamente do sertão baiano. Pelo critério de naturalidade que os emedebistas agora exigem como condição para atuar nas pastas municipais, o avô de Agenor não poderia nem sequer ocupar funções menores na prefeitura daquela época, se fosse o caso. Pior: depois de três meses suportando humilhações no Paço Municipal, o mesmo Agenor resolveu que “não vou me submeter a alguém que não foi eleito pelo povo”, convicção que ele deveria ter demonstrado quando tomou posse, no início de janeiro.
Paciência, leitora e leitor. Tem muito mais. Continuaremos. Mas vale lembrar a frase curta do deputado Bruno Peixoto, do MDB, mas que não segue a orientação do presidente Daniel Vilela, sobre a situação do prefeito Rogério Cruz: “O CPF e a credibilidade são dele”. Ninguém precisa dizer mais nada.