A falta de “oposição sólida” em Goiás e o sexo dos anjos
Alguns veículos de comunicação entraram em surto com uma frase do governador Ronaldo Caiado durante os festejos de instalação da capital na Cidade de Goiás, quando atribuiu o sucesso da sua gestão – hoje com 70% de aprovação popular – à “falta de oposição sólida”. Uma semana e meia se passou e ainda há jornalistas pressionando políticos de estilo antagonista para promover uma reação, ecoando o lenga-lenga de que em uma democracia a existência de oposição é um fator de importância, o que, aliás, é mesmo. Inaceitável a sua ausência, no entanto, quando é a força ou a prepotência que a suprime.
Só que a conjuntura presente do Estado não está conectada a essa condição. E não adianta espernear. A oposição desapareceu naturalmente e não por alguma imposição autoritária. O cientista político Luiz Signates proferiu há dois ou três meses um veredito impactante: “Não se observa qualquer contraponto crítico a Caiado, no momento”. Os inconformados correm para cá e para lá, na tentativa de despertar não apenas a oposição política, mas até o Ministério Público, o Tribunal de Justiça e subpoderes como os Tribunais de Contas, a Defensoria Pública e a própria voz maior da sociedade civil, a OAB. Claro, a Assembleia Legislativa em primeiríssimo lugar, porque é lá que ressoa tudo o que ocorre na esfera partidária e na movimentação em torno do poder (leia-se Palácio das Esmeraldas) em Goiás. Na concepção infantil que se lê nas páginas de O Popular, todas essas instituições deveriam ser… do contra.
LEIA TAMBÉM
O Popular exige oposição a Caiado. Como não há, o jornal se propõe a ocupar o espaço
Como a oposição foi zerada após a vitória de Caiado no ano passado
Dinheiro em caixa, oposição fraca e Poderes controlados: a coroação de Caiado
Vamos lá com essa distorção: o principal não está sendo considerado. Trata-se do aval geral da população e de quem ocupa postos de destaque para as políticas públicas tocadas pelo governador, precedidas pelo ajuste fiscal e administrativo que logrou implantar, em algumas áreas com resultados simplesmente espetaculares. Caso, por exemplo, da segurança pública, que especialistas enxergam como origem dos índices elevados de ótimo + bom atribuídos a Caiado. É fato: sacar dinheiro no caixa eletrônico, falar ao celular na calçada e deixar o carro estacionado nas ruas deixaram de ser ações de risco. Isso nunca se viu antes em Goiás, onde a regra era aceitar a criminalidade como consequência inevitável e irresolvível das desigualdades sociais – mantra ingênuo que a esquerda brasileira não abandona e em que em Goiás foi atropelado pela redução drástica da violência e da delituosidade.
Quem é que revelaria ânimo para se contrapor a um governo que realiza façanhas como essa? Que alternativas teria a propor? O Popular destacou o repórter Rubens Salomão para perambular pelos corredores da Assembleia atrás de deputados dispostos a provar que, sim, há “oposição sólida” em Goiás. Não encontrou viva alma. O clima na Casa é o de “deixar o homem trabalhar”. O jornalista chegou a ouvir pitos. Alguém respondeu que não é obrigado a ser agressivo ou passar o tempo polarizando com o governador. Uma espécie de “nos deixem trabalhar em paz”, também.
Tudo isso indica que o velho molde pelo qual a política estadual era vista não serve mais. Eis o ponto. As cabeças de antigamente perderam o fio da meada porque Caiado revolucionou os paradigmas – e isso muita gente não entende. Exige-se que os padrões dos tempos de Iris Rezende, Maguito Vilela e Marconi Perillo se repitam. Mas, acabou. Iris e Maguito morreram, Marconi idem (respeitosamente: sem desencarnar). Para absorver a realidade que veio aos poucos desde 2019 e agora é imperativa, tomou conta, é necessário abrir a moleira para o novo. Digamos que, em vez de uma “oposição sólida”, o que sobreveio é uma oposição formal, com partidos não alinhados, suave nas suas manifestações e atrás de metas de empoderamento, somente. Sem gana para destruir. Caiado venceu duas eleições no 1º turno, prevaleceu no front administrativo, consolidou uma consistente liderança popular (a visita da semana passada ao vale do Araguaia foi uma apoteose), acertou de cabo a rabo na gestão e reposicionou Goiás como um Estado a se admirar, tanto interna quanto externamente. Nada mais é como antes, o mundo é outro. Insistir no debate sobre haver ou não uma “oposição sólida” é saudosismo e corresponde a discutir o sexo dos anjos.